Celebração acontecer por uma Igreja servidora e pobre e reuniu cerca de 200 participantes.

Padre sinodais reunidos em Roma para a Assembleia Especial do Sínodo da Pan-Amazônia renovaram o Pacto das Catacumbas, neste domingo domingo (20), mesmo local que mudou os rumos da Igreja Católica há 54 anos.

A celebração nas Catacumbas de Domitila foi presidida pelo Arcebispo emérito de São Paulo, Cardeal Cláudio Hummes e reuniu padres sinodais, indígenas, missionários, leigos e leigas, que renovaram o compromisso de uma Igreja servidora, empenhada em defender os mais pobres e em situação de vulnerabilidade. Mais de 40 bispos participaram da celebração.

Estavam presentes ainda o Arcebispo de Huancayo, no Peru, e vice-presidente da Rede Eclesial Pan-Amazônica (Repam), Cardeal Pedro Ricardo Barreto Jimeno, além de representantes da Igreja Evangélica de Confissão Luterana e da Assembleia de Deus.

Em sua homilia, Dom Cláudio Hummes afirmou que o Pacto das Catacumbas é um momento comovente e significativo. “Fazer memória nessas Catacumbas, terra santa em que pisamos, nos comove, inspira e nos faz lembrar os primeiros tempos da Igreja”.

Aos que disseminam notícias falsas e maldosas sobre o Sínodo para a Amazônia, Dom Cláudio lembrou que este sínodo é fruto do Concílio Vaticano II.

“Vivemos tempos de perseguição aos testemunhos. A Igreja sempre se reforma e volta as suas raízes. Devemos pregar a Palavra sem medo e com profunda convicção”.

O Cardeal afirmou ainda que ‘o que mais se opõe ao Reino de Deus são aqueles que desejam acumular riquezas e dinheiro a custas da natureza e de qualquer coisa. “Você não pode servir a Deus e ao dinheiro. A Igreja não pode esquecer dos pobres”.Diego Rosa

Diego Rosa

Dom Erwin recebe estola que foi de Dom Helder Câmara.


Dom Cláudio usou a estola que foi de Dom Helder Câmara, um dos idealizadores desse compromisso em novembro de 1965. Emocionado, o Cardeal a entregou a Dom Erwin Kräutler, homenageando o bispo emérito da Prelazia do Xingu (PA).

Na celebração, Dom Adriano Ciocca Vasino, bispo da Prelazia de São Félix do Araguaia usou uma túnica que foi de Dom Helder.

Ao final da celebração, o Pacto pela Casa Comum foi assinado pelas bispos, padres, missionários, indígenas, leigos e leigas que participaram da celebração.

Dom Erwin Kräutler:

Sobre esse momento histórico da Igreja Católica, o bispo emérito lembrou que é um Pacto pela Casa Comum, inspirado no primeiro pacto de novembro de 1965, realizado durante o Concílio Vaticano II.“É a renovação também da opção pelos pobres. É um compromisso de todos os bispos e de todos que estiveram aqui nas Catacumbas de levar adiante este chamado. O Sínodo vai ser uma nova posição que a Igreja toma pela Amazônia, marco na história da Igreja.É pelos pobres materialmente e pelos que são rejeitados. Falo dos povos indígenas, povos originários. A maior pobreza que se pode ter é quando alguém tira a identidade desses povos, esperando que deixem de ser indígenas, para que os poderosos conseguirem tirar suas riquezas naturais que estão nas áreas indígenas.Podemos andar juntos nesse Pacto na luta pela natureza, pela preservação da Amazônia. É uma luta comum que ultrapassa todas as barreiras.Receber a estola de Dom Helder foi uma surpresa que nunca esperei, porque o conheci pessoalmente e para mim ele é o bispo dos pobres, que levou o seu compromisso com os pobres até o último suspiro. Ele deu uma mensagem não apenas para o Brasil, mas para o mundo inteiro. Sempre lembrando que a Igreja faz a opção que Jesus fez, a opção pelos pobres”, afirmou Dom Erwin.

Em entrevista à Rede Aparecida de Comunicação, o Cardeal Cláudio Hummes falou sobre o Pacto das Catacumbas:

“Em primeiro lugar é um Pacto, de fato, para a Amazônia, mas é um pacto para nós todos em qualquer lugar, para a Igreja como um todo. Um Pacto pela Casa Comum, isso serve para toda Igreja e, sobretudo pela Amazônia, porque é em favor da paz em comum, da Amazônia. E a Casa Comum é a terra inteira, o povo.
É uma memória do que foi o Concílio, momento da Igreja que se reformou e, sobretudo, teve em vista a questão dos povos, um presente na mente, na consciência da Igreja, e também na América Latina foi levado muito a sério.
Dom Helder Câmara esteve aqui fazendo esse Pacto, junto com outros, em favor dos Pobres. E nós continuando essa tradição, esse mesmo espirito, vamos renovar este Pacto das Catacumbas.
Homenagear Dom Helder é, sobretudo, deixar-se invadir pela força que ele deu, a inspiração com que ele trabalhou no mundo inteiro e não só no Brasil, mas no mundo inteiro, pelos povos. Assim nós temos que trabalhar, em especial, pela Casa Comum”.

:: Mais sobre o Sínodo para a Amazônia ::

Pacto das Catacumbas – Dias antes do encerramento do Concílio Vaticano II, em 1965, o número de 42 padres conciliares celebraram uma Eucaristia nas Catacumbas de Domitila, em Roma.

Os padres conciliares reuniram-se pedindo fidelidade ao Espírito de Jesus e assinaram o ‘Pacto das Catacumbas’’ em comprometimento com os mais pobres e uma Igreja servidora. Na época, entre os idealizadores desse compromisso estava o Arcebispo de Olinda e Recife, Dom Helder Câmara.

Catacumbas de Domitila – A igreja subterrânea foi dedicada aos mártires Nereu e Aquileu. Os túmulos dos mártires estão sob o altar da Basílica, ao lado da tumba de Santa Petrolinia. As galerias possuem 17 quilômetros de extensão, quatro andares e centenas de sepulturas escavadas nas paredes dos corredores. Toda essa área foi doada pela nobre Flávia Domitila, neta do imperador Vespasiano.

Pacto das Catacumbas pela Casa Comum-PDF

Pacto das Catacumbas pela Casa Comum

Por uma Igreja com rosto amazônico, pobre e servidora, profética e samaritana

Nós, participantes do Sínodo Pan-amazônico, partilhamos a alegria de habitar em meio a numerosos povos indígenas, quilombolas, ribeirinhos, migrantes, comunidades na periferia das cidades desse imenso território do Planeta. Com eles temos experimentado a força do Evangelho que atua nos pequenos. O encontro com esses povos nos interpela e nos convida a uma vida mais simples de partilha e gratuidade.  Marcados pela escuta dos seus clamores e lágrimas, acolhemos de coração as palavras do Papa Francisco:

“Muitos irmãos e irmãs na Amazônia carregam cruzes pesadas e aguardam pela consolação libertadora do Evangelho, pela carícia de amor da Igreja.  Por eles, com eles, caminhemos juntos”[1].

Evocamos com gratidão aqueles bispos que, nas Catacumbas de Santa Domitila, ao término do Concílio Vaticano II, firmaram o Pacto por uma Igreja servidora e pobre[2].  Recordamos com veneração todos os mártires membros das comunidades eclesiais de base, de pastorais e movimentos populares; lideranças indígenas, missionárias e missionários, leigas e leigos, padres e bispos, que derramaram seu sangue, por causa desta opção pelos pobres, por defender a vida e lutar pela salvaguarda da nossa Casa Comum[3]. À gratidão por seu heroísmo unimos nossa decisão de continuar sua luta com firmeza e coragem. É um sentimento de urgência que se impõe ante as agressões que hoje devastam o território amazônico, ameaçado pela violência de um sistema econômico predatório e consumista.

Diante da Trindade Santa, de nossas Igrejas particulares, das Igrejas da América Latina e do Caribe e daquelas que nos são solidárias na África, Ásia, Oceania, Europa e no norte do continente americano, aos pés dos apóstolos Pedro e Paulo e da multidão dos mártires de Roma, da América Latina e em especial da nossa Amazônia, em profunda comunhão com o sucessor de Pedro, invocamos o Espírito Santo,   e  nos comprometemos pessoal e comunitariamente com o que se segue:

  1. Assumir, diante da extrema ameaça do aquecimento global e da exaustão dos recursos naturais, o compromisso de defender em nossos territórios e com nossas atitudes a floresta amazônica em pé. Dela vêm as dádivas das águas para grande parte do território sul-americano, a contribuição para o ciclo do carbono e regulação do clima global, uma incalculável biodiversidade e rica socio diversidade para a humanidade e a Terra inteira.
  2. Reconhecer que não somos donos da mãe terra, mas seus filhos e filhas, formados do pó da terra (Gn 2, 7-8)[4]hóspedes e peregrinos (1 Pd 1, 17b e 1 Pd 2, 11)[5], chamados a ser seus zelosos cuidadores e cuidadoras (Gn 1, 26)[6]. Para tanto, comprometemo-nos com uma ecologia integral, na qual tudo está interligado, o gênero humano e toda a criação porque a totalidade dos seres são filhas e filhos da terra e sobre eles paira o Espírito de Deus (Gn 1, 2).
  3. Acolher e renovar a cada dia a aliança de Deus com todo o criado: “De minha parte, vou estabelecer minha aliança convosco e com vossa descendência, com todos os seres vivos que estão convosco, aves, animais domésticos e selvagens, enfim, com todos os animais da terra que convosco saíram da arca (Gn 9, 9-10 e Gn 9, 12-17[7]).
  4. Renovar em nossas igrejas a opção preferencial pelos pobres, em especial pelos povos originários, e junto com eles garantir o direito de serem protagonistas na sociedade e na Igreja. Ajudá-los a preservar suas terras, culturas, línguas, histórias, identidades e espiritualidades. Crescer na consciência de que estas devem ser respeitadas local e globalmente e, consequentemente favorecer, por todos os meios ao nosso alcance, que sejam acolhidas em pé de igualdade no concerto mundial dos demais povos e culturas.
  5. Abandonar, como decorrência, em nossas paróquias, dioceses e grupos toda espécie de mentalidade e postura colonialista, acolhendo e valorizando a diversidade cultural, étnica e linguística num diálogo respeitoso com todas as tradições espirituais.
  6. Denunciar todas as formas de violência e agressão à autonomia e direitos dos povos originários, à sua identidade, aos seus territórios e às suas formas de vida.
  7. Anunciar a novidade libertadora do evangelho de Jesus Cristo, na acolhida ao outro e ao diferente, como sucedeu com Pedro na casa de Cornélio: “Vós bem sabeis que a um judeu é proibido relacionar-se com um estrangeiro ou entrar em sua casa. Ora, Deus me mostrou que não se deve dizer que algum homem é profano ou impuro” (At 10, 28)[8].
  8. Caminhar ecumenicamente com outras comunidades cristãs no anúncio inculturado e libertador do evangelho, e com as outras religiões e pessoas de boa vontade, na solidariedade com os povos originários, com os pobres e pequenos, na defesa dos seus direitos e na preservação da Casa Comum
  9. Instaurar em nossas igrejas particulares um estilo de vida sinodal, onde representantes dos povos originários, missionários e missionárias, leigos e leigas, em razão do seu batismo, e em comunhão com seus pastores, tenham voz e voto nas assembleias diocesanas, nos conselhos pastorais e paroquiais, enfim em tudo que lhes compete no governo das comunidades.
  10. Empenhar-nos no urgente reconhecimento dos ministérios eclesiais já existentes nas comunidades, exercidos por agentes de pastoral, catequistas indígenas, ministras e ministros e da Palavra, valorizando em especial seu cuidado em relação aos mais vulneráveis e excluídos.
  11. Tornar efetiva nas comunidades a nós confiadas a passagem de uma pastoral de visita a uma pastoral de presença, assegurando que o direito à Mesa da Palavra e à Mesa de Eucaristia se torne efetivo em todas as comunidades.
  12. Reconhecer os serviços e a real diaconia do grande número de mulheres que hoje dirigem comunidades na Amazônia e procurar consolidá-los com um ministério adequado de mulheres dirigentes de comunidade.
  13. Buscar novos caminhos de ação pastoral nas cidades onde atuamos, com protagonismo de leigos e jovens, com atenção às suas periferias e aos migrantes, aos trabalhadores e aos desempregados, aos estudantes, educadores, pesquisadores e ao mundo da cultura e da comunicação[9].
  14. Assumir diante da avalanche do consumismo um estilo de vida alegremente sóbrio, simples e solidário com os que pouco ou nada tem; reduzir a produção de lixo e o uso de plásticos, favorecer a produção e comercialização de produtos agroecológicos, utilizar sempre que possível o transporte público.
  15. Colocar-nos ao lado dos que são perseguidos pelo profético serviço de denúncia e reparação de injustiças, de defesa da terra e dos direitos dos pequenos, de acolhida e apoio a migrantes e refugiados. Cultivar amizades verdadeiras com os pobres, visitar as pessoas mais simples e os enfermos, exercitando o ministério da escuta, da consolação e do apoio que trazem alento e renovam a esperança.

Conscientes de nossas fragilidades, de nossa pobreza e pequenez diante de tão grandes e graves desafios, confiamo-nos à oração da Igreja. Que sobretudo nossas Comunidades Eclesiais nos socorram com sua intercessão, afeto no Senhor e, sempre que necessário, com a caridade da correção fraterna.

Acolhemos de coração aberto o convite do Cardeal Hummes para nos deixarmos guiar pelo Espírito Santo nestes dias do Sínodo e no retorno às nossas igrejas:

“Deixem-se envolver no manto da Mãe de Deus e Rainha da Amazônia. Não deixemos que nos vença a auto-referencialidade, mas sim a misericórdia diante do grito dos pobres e da terra. Será necessária muita oração, meditação e discernimento, além de uma prática concreta de comunhão eclesial e espírito sinodal. Este sínodo é como uma mesa que Deus preparou para os seus pobres e nos pede a nós que sejamos aqueles que servem à mesa[10].

Celebramos esta Eucaristia do Pacto como “um ato de amor cósmico. “Sim, cósmico! Porque mesmo quando tem lugar no pequeno altar duma igreja de aldeia, a Eucaristia é sempre celebrada, de certo modo, sobre o altar do mundo”. A Eucaristia une o céu e a terra, abraça e penetra toda a criação. O mundo saído das mãos de Deus, volta a Ele em feliz e plena adoração: no Pão Eucarístico “a criação propende para a divinização, para as santas núpcias, para a unificação com o próprio Criador”. “Por isso, a Eucaristia é também fonte de luz e motivação para as nossas preocupações pelo meio ambiente, e leva-nos a ser guardiões da criação inteira”.[11]

Catacumbas de Santa Domitila

Roma, 20 de outubro de 2019

Com informações de A12

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